Interagir e transformar são os verbos que norteiam o Café+, a iniciativa interna da CBA B+G que é um espaço para pensar sustentabilidade, diversidade, inclusão e muitos outros temas urgentes. No último mês, aconteceu o Café+ Circularidade, em que o convidado foi Fabio Sant’Ana, especialista em Desenvolvimento de Mercado de Embalagens para Economia Circular e Bens de Consumo da Braskem.
Compilamos algumas passagens do bate-papo, que durou quase duas horas e contou com a participação de uma sala lotada de pessoas com indagações e interesse no que o designer e empreendedor tinha para compartilhar.
Como o design deve repensar o plástico na embalagem?
Como sabemos, este é um tema urgente, e o mercado tem mudado muito no que diz respeito ao briefing para a produção de embalagens. Antes, o desenvolvimento era pautado em custo, desempenho e comunicação; hoje o cenário mudou: esses fatores continuam importantes, claro, mas outros drivers, como sustentabilidade e conveniência, foram incluídos.
Os constantes movimentos do consumidor exigindo o compromisso das empresas com a sustentabilidade tornou o ambiente mais complexo. Neste contexto, que requer um olhar ampliado, o modelo de economia circular ganha força, e nele o design desempenha um papel muito importante.
Nos conte um pouco mais sobre a economia circular.
A economia circular é um modelo de negócio que traz um olhar sobre sustentabilidade que é intrínseco ao processo de industrialização e monetização, diferentemente do modelo de economia linear. Nesse último, o auge é quando o consumidor compra o produto, e a ideia é fazê-lo comprar novamente. Acontece que, nesse modelo, a extração de matéria-prima é constante e em alto volume, enquanto o valor do produto diminui drasticamente após o uso, pois após o uso não é considerada nenhuma alternativa que não o descarte de baixo valor.
No modelo de economia circular, temos a valorização do reuso e soluções alternativas para o pós-consumo, tais como manutenção, remanufatura e reciclagem. Se focarmos apenas no modelo de reuso, o qual propõe a utilização dos produtos por mais tempo, vemos que acabam surgindo diferentes oportunidades de novos modelos de negócios associados a ele. E isso requer um pensamento voltado ao design.
Como assim? Como a economia circular estimula novos modelos de negócio? Ela é inovadora em que sentido?
No sentido em que o foco se desloca do produto em si apenas, voltando-se para serviços. Por exemplo: existem marcas de móveis que, familiarizadas com as práticas da economia circular, tem desenvolvido um novo serviço: a recompra de móveis usados (buy back service) – e fazendo isso com uma narrativa interessante e envolvente, propondo que móveis velhos ganhem uma nova vida. Outro exemplo: há não muito tempo, a máxima de uma empresa de computadores era afirmar ser capaz de montar seus computadores em dois minutos. Hoje, seu KPI certamente está se movendo para a oferta de um produto que também possa ser DESmontado em dois minutos… É a aplicação do conceito reuse, recicle, reduza, e isso impacta diretamente no tipo de produto que nós, designers, temos de propor e desenhar.
Na sua opinião, o que se deve fazer para ampliar a visão sobre ‘produto como serviço’ e engajar as empresas nesta questão?
É um caminho complexo. Dentro da Braskem, vemos assim: existe uma equipe dedicada à venda de resinas e esta têm um foco de curto prazo. Enquanto isso, a área de desenvolvimento de mercado pensa num escopo de médio e longo prazo, prevendo e planejando cinco anos à frente, de modo que haja mercado futuro para os gerentes atuarem. Então é uma construção, uma transição longa, contínua e extremamente necessária. É um exercício de olhar para outras direções e mudar a forma de se relacionar com os produtos. Precisamos encarar o tema da escassez, e nesse sentido, a economia circular, como modelo híbrido, se apresenta como um caminho viável: é mais sustentável tanto economicamente – na busca por soluções e modelos que substituem o uso pelo reuso, a produção de bens pela oferta de serviços – como também ambientalmente, propondo maior equilíbrio dos ecossistemas.
É um tema controverso, ainda mais numa petroquímica. Pensando do nosso ponto de vista, como um escritório de design, qual deve ser a abordagem com os clientes? Onde focar primeiro: nos recursos materiais, na logística, no pós-consumo?
Não existe uma receita pronta, depende do mercado em que cada empresa atua. No setor de alimentos, por exemplo, a atenção dada à embalagem tem um olhar específico, pois funciona quase como um conceito estendido da saúde e nutrição que ela envolve. No setor de produtos de higiene, por outro lado, a questão do consumo de água é crucial, então a abordagem pode ser a sustentabilidade no processo industrial.
Mas toda a indústria, em maior ou menor medida, está lançando seus compromissos com a sustentabilidade, que estão baseados em quatro pilares: otimização de material; produção de embalagens 100% recicláveis, reutilizáveis ou compostáveis; uso de reciclado e uso de renovável. A partir disso, é preciso olhar pra necessidade do cliente e entender: onde ele está inserido? Qual o tipo de negócio dele? Qual a jornada do seu consumidor? E como integrar com a jornada da embalagem tornando-a mais circular e sustentável? Enquanto indústrias pensam em eficiência, o setor FMCG valoriza também outros atributos, como experiência de consumo. O poder da marca fala de forma diferente dependendo dos universos. Tudo isso traz propostas de valor diferentes para o cliente.
De fato, há uma grande oportunidade para se trabalhar a jornada do consumidor. Como desenhar um produto pensando nessa jornada?
Influenciar a jornada é um caminho que pode ser o inicial, mas o pensamento circular é muito maior. É uma responsabilidade das empresas e dos consumidores. Veja, o mundo funciona numa forma linear, esse é o desafio. Todo mundo tem que ceder e colaborar a partir do seu lugar; é mais que embalagem sustentável, é uma solução sustentável. O ciclo inteiro – a oferta, o uso, o reuso – requer uma transição para novos modelos de pensamento e de consumo. Estamos todos em busca de soluções, e não se trata apenas de quem “paga” pelas mudanças.